Poema e imagens de Amor e saudade, sentir de verdade

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Poema de amor até amanhecer

Quero amar… amar até doer
Sentir dor por amar, até adormecer
Doer por amor logo ao amanhecer
Pensar-te até te ver
Sair da dor por sentir o amor
Sair do amor e sentir dor
Sem desertos, sem vazios
Quero sentir sempre… continuamente
Sem deixar entorpecer nenhum sentido
Quero-os despertos, abertos, libertos
Mesclados em sentimentos profusos
Que me fazem rir e chorar
Mas sempre por amar

               ****Camila Carreira****

Momentos de cultura e curiosidade poéticas... 


800 anos de poesia portuguesa

Jorge Reis-Sá e Rui Lage antologiaram 800 anos de poesia num calhamaço de 2149 páginas que reúne mais de dois mil poemas de 267 autores. (2010)

"Poemas Portugueses. Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI"

Jorge Reis-Sá e Rui Lage, reúne, num só e gigantesco volume de mais de duas mil páginas, publicado pela Porto Editora, 267 poetas portugueses, de Pai Soares de Taveirós, activo no início do século XIII, até  Pedro Mexia, um tanto hiperactivo neste início do século XXI.

camila carreira poetisa portuguesa contemporánea Há mais de 30 anos que ninguém se abalançava a propor uma antologia panorâmica de toda a poesia portuguesa. O último tinha sido Alexandre Pinheiro Torres, em 1977, com a sua monumental "Antologia da Poesia Portuguesa", cujas mais de três mil páginas acabam em Florbela Espanca (n. 1894). Se se podem apontar precedentes a "Poemas Portugueses", os mais plausíveis serão, além deste, o conjunto das quatro séries das "Líricas Portuguesas", respectivamente organizadas por Régio, Cabral do Nascimento, Sena e Ramos Rosa. E poderia ainda referir-se o volume "800 Anos de Poesia Portuguesa", organizado por Orlando Neves e Serafim Ferreira em 1973, mas, com as suas 544 páginas, seria comparar um peso-pluma a um candidato ao título de pesados.

Antes de se esmiuçar estes "Poemas Portugueses", que é o que se tentará fazer adiante, convém deixar alguns avisos à navegação. Criticar antologias, sobretudo quando a crítica não se limita a generalidades e discute presenças e ausências de poetas e poemas, é sempre um exercício pouco defensável, já que, no limite, se trata inevitavelmente de propor uma subreptícia antologia alternativa, que o crítico, ao contrário dos efectivos antologiadores, não se deu ao trabalho de fazer.  Mais duvidoso ainda é exigir a uma antologia, como muitas vezes acontece, que esta seja o que nunca se propôs ser. Há quem privilegie antologias que aspiram a ser representativas, outros preferem escolhas mais ferozmente pessoais. O que não faz sentido é criticar, por exemplo, "Edoi Lelia Doura", de Herberto Helder, ou a recente "A Perspectiva da Morte: (20-2) Poetas Portugueses do Século XX", de Manuel de Freitas, por não serem "representativas" - e até o são exemplarmente, no sentido em que representam os respectivos autores -, ou, inversamente, censurar Reis-Sá e Lage por não terem saltado directamente de Camões para a segunda metade do século XIX, argumentando que tudo o que está no meio é uma boa chatice, o que, ressalvadas algumas honrosas excepções, nem andará muito longe da verdade.

Não quer isto dizer que os critérios e metodologias não sejam discutíveis. Nesta antologia, uma das opções questionáveis é o recurso a terceiros para redigir os verbetes de apresentação dos poetas. Vasco Graça Moura, que prefacia o livro e assina mais de meia centena de verbetes, sublinha este aspecto como uma mais-valia. E até terá alguma razão. Além dos seus próprios competentes textos introdutórios, basta pensar nas dezenas de verbetes que Giulia Lanciani e Giuseppe Tavani redigiram para o período medieval para acalentarmos a legítima suspeita de que, como leitores, ficamos mais bem servidos do que o ficaríamos se Reis-Sá e Lage tivessem assinado todas as 267 introduções. Mas é um sistema perigoso, já que nada garante que a visão que o autor do verbete propõe do poeta em causa coincida com a que se dá a ler na escolha dos seus poemas.

Tentações discordantes

poemas de amor, rosas e cinzas, camila carreira, poetisaPara citar apenas um exemplo concreto, é estranho ler-se o texto assumidamente empático que Pedro Eiras dedica a Manuel Gusmão e descobrir-se, depois, que este está representado com um único poema. Exemplo que, aliás, ilustra bem o que, nesta antologia, parece ser uma indecisão mal resolvida: dir-se-ia que os organizadores, sobretudo no que respeita ao século XX, oscilam entre não querer deixar de fora quaisquer autores suficientemente "canónicos" - o que, de resto, poderia pôr em risco a previsível boa fortuna desta obra nos meios escolares - e a tentação, contrária, de deixar a marca do seu gosto pessoal, o que, por sua vez, explicaria a hiper-representação de outros poetas. Mas, numa antologia que inclui 14 poemas de Eduarda Chiote, teria sido talvez mais coerente rasurar Gusmão - e eventualmente justificá-lo na introdução - do que representá-lo com um só poema.

Justamente porque esta é uma antologia que corre riscos, não sendo mera fixação de um cânone mais ou menos previamente estabelecido - o que, aliás, seria impossível no que respeita aos autores mais recentes -, é pena que a introdução apenas nos lembre que ela resulta do encontro de "dois gostos", não adiantando nada sobre o modo como as presumíveis divergências de juízo foram dirimidas. Rui Lage (n.1975) e Jorge Reis-Sá (n.1977) têm idades próximas e ambos são poetas. Reis-Sá é também editor, e organizara já uma antologia da poesia portuguesa dos anos 90 e do início do século XXI. Passando deselegantemente dos factos à opinião, acrescente-se que Lage é um poeta relevante e um ensaísta e crítico bem apetrechado, e que Reis-Sá, a quem não escassearão outros méritos, não é uma coisa nem outra. Daí que este leitor estivesse interessado em saber se esta escolha é uma acumulação de dois gostos, o seu mínimo denominador comum, ou, não sendo uma coisa nem outra, que princípios orientaram a mistura.

Um dos aspectos menos criticáveis numa antologia é o das balizas temporais. As antologias têm de acabar em algum sítio, e esse sítio é sempre arbitrário. Lage e Reis-Sá explicam que a "meta final" desta é 1999 e que deixaram de fora "poetas que se tenham estreado [em livro] no ainda recém-nascido século XXI". No entanto, os poemas incluídos vão até 2008. Talvez não tenha sido a melhor opção. Desde logo, porque o século XX terminou a 31 de Dezembro de 2000 e ainda pôde, por essa feliz circunstância, assistir à estreia de Manuel de Freitas, que seria um nome forte para fechar este volume, caso aceitasse integrá-lo. E nele passaria ainda a caber Ana Paula Inácio, mesmo descontando o livro a quatro mãos que publicou em 1990.

E, já que leram poemas até 2008, por que não acabar simplesmente no último poeta que lhes parecesse relevante? Assim nunca saberemos se a ausência de José Luís Peixoto é um mero acaso ou é mesmo mérito dos seleccionadores.
Os preparativos de viagem já vão longos, mas, antes de iniciarmos a travessia, encerre-se o capítulo dos critérios e métodos com uma referência à inusitada profusão de excertos a que esta antologia recorre, particularmente discutíveis num volume com espaço para os evitar.

Um início promissor

"Poemas Portugueses" abre com uma bela cantiga de amor de Pai Soares de Taveirós, que deve ter sido escrita há mais ou menos 800 anos. Se há período literário cuja selecção parece francamente inatacável nesta antologia é o dos cancioneiros medievais dos séculos XIII e XIV. São cento e tal páginas de luminosa poesia, com excelentes introduções e notas de Lanciani e Tavani.

Sendo mais sucinta do que a de Pinheiro Torres, a escolha de Lage e Reis-Sá é também mais criteriosa. Nenhum dos 20 autores que desaparecem é particularmente relevante, e "Poemas Portugueses" fez bem em acrescentar outros, como Pero Gonçalves de Porto Carreiro (num livro bem revisto, o Conçalves é uma das excepções à regra) ou o judeu Vidal, com uma heterodoxa cantiga de amigo endereçada à "mui fremosinha de Elvas".

Mais discutível parece ser o espaço concedido ao Cancioneiro de Garcia de Resende. Se excluirmos os primeiros grandes poetas renascentistas que nele fortuitamente figuram - Gil Vicente, Bernardim e Sá de Miranda -, o que se aproveita desta compilação organizada no início do século XVI são pérolas soltas, como a célebre "Cantiga sua, partindo-se", de João Roiz de Castel-Branco, ou algumas sátiras mais bem conseguidas. O resto oscila, com poucas excepções, entre um humor convencional e uma poesia compostinha, de jogo de salão.

Algumas das 90 páginas que o livro dedica a esta época, inlcuindo boa parte das 22 que concede ao próprio Garcia de Resende - mais do que as atribuídas a Pessanha, Sá-Carneiro ou Cesariny -, talvez pudessem ter sido utilizadas com maior proveito em poetas doutros períodos. Bastante exageradas, também, as 19 páginas atribuídas a Anrique da Mota, mesmo que se reconheça que é um autor que merece ser recuperado.

Mas o leitor que pudesse começar a sentir-se entediado rapidamente acorda do seu torpor ao chegar a Gil Vicente e Bernardim Ribeiro, ambos bem seleccionados. No caso do primeiro, o recurso sistemático aos excertos era inevitável, e Reis-Sá e Lage acrescentaram aos que habitualmente surgem nas antologias outros menos requisitados, mas não menos interessantes.

Atravessa-se depois a notável e inevitável écloga "Crisfal", incertamente atribuída a Cristóvão Falcão, de que se dão abundantes excertos, e aterra-se num dos grandes poetas portugueses de todos os tempos, Francisco Sá de Miranda, amplamente representado.

Cumes e desertos


Nos poucos poetas antologiados entre Sá de Miranda e Camões, António Ferreira e Diogo Bernardes são, sem surpresa, os mais bem representados. Algo desconcertante é a própria escolha da poesia de Camões. As 82 páginas que recebeu - pouco mais de metade das que conta Fernando Pessoa - permitem-nos, felizmente, ler na íntegra as redondilhas "Super Flumina Babylonis", ditas de Babel e Sião. E os organizadores também não pouparam nos sonetos, tendo seleccionado 44. Muitos leitores estariam talvez dispostos a prescindir de 10 ou 20 em troca da ode "Pode um desejo imenso" ou das canções "Junto de um seco, fero e estéril monte" e "Vinde cá, meu tão certo secretário", todas elas bastante escandalosamente ausentes deste volume.

Separado por Camões do seu irmão Diogo Bernardes, Frei Agostinho da Cruz teve direito a dez páginas. Merecidas, na talvez minoritária opinião deste leitor. Lamentável, embora compreensível num volume desta extensão, é a gralha que pousou na sua elegia "Da Arrábida", transformando um "em segredo" num "sem segredo".

Boa aposta, também, o espaço concedido a Frei Bernardo de Brito, autor da iniciática obra "Sílvia de Lisardo", que antecede o humor um pouco grosso de Fernão Rodrigues Lobo Soropita. Seguem-se 27 páginas de Francisco Rodrigues Lobo, outro cume da lírica portuguesa, e a coisa volta depois a descer um tanto de nível com D. Francisco de Portugal, um entediante Manuel da Veiga Tagarro e mais duas razoáveis irrelevâncias da "Fénix Renascida": Jacinto Freire de Andrade e D. Tomás de Noronha.

Aplaude-se, sim, a inclusão da admirável Soror Violante do  Céu. Os três sonetos seleccionados são todos bons, mas mereceria estar aqui, pelo menos, esse alto exemplar do conceptualismo barroco que é o soneto "Será brando o rigor, firme a mudança".

Também o senhor que se segue, D. Francisco Manuel de Melo, não está muito bem servido, ao passo que as nove páginas de António Barbosa Bacelar são um claro exagero. Aturam-se depois mais umas 30 e tal páginas de outros maçadores nascidos no século XVII, entre as quais sempre se salvam algumas passagens das oitavas de Soror Madalena da Glória, e entra-se, com Paulino António Cabral, vulgo Abade de Jazente, no primeiro poeta nascido no século XVIII. Há subtis laços, quer temáticos, quer respeitantes a uma certa visão ética do país, que aproximam a poesia do abade da de Rui Lage, o que talvez explique o inflacionado número de páginas (11) que lhe é concedido. São menos questionáveis as oito de Correia Garção, mas já as 12 atribuídas a Domingos dos Reis Quita constituem uma extravagância.

Ressalvados Tolentino (de quem falta, provocatoriamente, "O colchão dentro do toucado") e Bocage - e mesmo esses estarão hipervalorizados -, a centena de páginas que o leitor ainda terá de percorrer até chegar a Garrett são um deserto onde raramente uma brisa mais fresca lhe aliviará a fadiga da jornada

Aposta em Gomes Leal


Almeida Garrett foi bem seleccionado, mas poderia tê-lo sido em menos de 20 páginas, desde que as sobejantes não fossem alimentar os poetas seguintes: Feliciano de Castilho, cujo interminável "A Visão" se deve saltar sem remorso, Herculano, melhor prosador do que poeta, e o dispensável João de Lemos. Soares de Passos é uma curiosidade ultra-romântica que sempre nos recorda as poesias que as nossas avós nos liam.

Se não se percebe muito bem que João de Deus tenha sido despachado em duas páginas, justifica-se, sim, o espaço dado ao muito esquecido Guilherme de Azevedo, que publicou em 1874 esse notável soneto que abre com o verso "Ó máquinas febris! Eu sinto a cada passo", aqui felizmente reproduzido.

Antero de Quental, bem representado, pode não ter escrito muitos poemas realmente extraordinários, mas se o espiritualismo romântico tem um digno representante em Portugal, é decerto o autor dos "Sonetos".

Aposta forte de Lage e Reis-Sá foi Gomes Leal, o poeta do século XIX mais profusamente representado. É difícil não simpatizar com esta revalorização de Gomes Leal, que tem alguns poemas notáveis e momentos fulgurantes em muitos outros. No entanto, é, de facto, um poeta desigual, pelo que acaba por não aguentar muito bem a latitude desta escolha.

Junqueiro não envelheceu bem, mas as 15 páginas de que aqui dispõe, sendo excessivas, não poderiam ser muito menos para não se lhe fazer a injustiça de o equiparar a um Gonçalves Crespo ou a um (mais interessante) Conde de Monsaraz, ambos presentes numa antologia que estranhamente dispensa António Feijó.

Nada há a apontar à selecção do nosso maior poeta do século XIX, Cesário Verde, salvo que teria sido preferível dispensar "Em Petiz" do que dar apenas uma das suas partes. A selecção de António Nobre é mais surpreendente, mas as surpresas não parecem compensar algumas ausências.

De Pessanha, Reis-Sá e Lage escolheram 21 poemas. É pena que tenham deixado de fora "Inscrição", "Se andava no jardim" e, sobretudo, "Imagens que passais pela retina" e "Branco e Vermelho", duas das mais estranhas ausências desta antologia.

Em Eugénio de Castro, a exemplarmente simbolista "A Epifania dos Licornes" podia ter sido dada na íntegra. Justificar-se-ia ainda incluir, entre o autor de "Oaristos" e o génio alucinado de Ângelo de Lima, o poeta açoriano de "Almas Cativas", Roberto de Mesquita, bastante melhor do que o aqui representado José Duro.

De Pascoaes dão-se quatro poemas. Podia estar mais bem representado, por muito difícil que nos seja hoje ler alguns dos seus poemas mais longos - é um caso em que os excertos se justificam, como Cesariny deixou claro na antologia que dele organizou. E, antes de Pessoa, temos ainda cinco páginas de António Patrício, duas de Afonso Lopes Vieira e três de Afonso Duarte.

Pessoa a mais e a menos

Pessoa tem 159 páginas, 70 das quais assinadas pelo poeta ortónimo, às vezes injustamente desvalorizado em benefício da sua mais espectacular faceta de Álvaro de Campos, que se teve de contentar com 45. Caeiro, com 34, ocupa o terceiro lugar deste pódio de um só atleta, e Ricardo Reis fica-se por umas comparativamente escassas dez páginas. Tudo somado, é muita página, mas, mesmo assim, há algumas ausências a lamentar. Começando pelo ortónimo, incluir sete dos poemas que Pessoa, no final da vida, escreveu a atacar Salazar e o Estado Novo é privilegiar curiosidades em detrimento de poemas de qualidade bastante menos discutível, como o soneto "Emissário de um rei desconhecido", do ciclo "Passos da Cruz",  ou "Abdicação", ou "Pobre velha música", para só citar alguns.

Campos ocupa 45 páginas, mas, dada a extensão das suas grandes odes, só tem dez poemas, nos quais não couberam, por exemplo,  "Opiário", "Escrito num livro abandonado em viagem", "Acaso" ou, para não alongar a lista, "Grandes sãos os desertos, e tudo é deserto". Já à selecção de Caeiro só se pode apontar a desmesura. Numa antologia deveras desprendida a usar excertos, encarar "O Guardador de Rebanhos" como uma unidade indivisível parece um escrúpulo excessivo. Caeiro podia bem ter cedido algumas páginas a Reis, que permitiriam incluir "Nada fica de nada. Nada somos" ou "Para ser grande, sê inteiro".

Ao deixarmos Pessoa, ainda a jornada vai a meio, o que nos obrigará a acelerar o passo, ou corremos o risco de prolongar o comentário deste livro até às páginas dos discos. Dos restantes autores ainda nascidos no século XIX, as inclusões não surpreendem: ao lado dos autores ligados ao primeiro modernismo - Mário de Sá-Carneiro, Luís de Montalvor, Armando Côrtes-Rodrigues, Alfredo Guisado e Almada-Negreiros  -, o volume salva os saudosistas Augusto Casimiro e Mário Beirão, a singular Irene Lisboa, Florbela Espanca, Mário Saa, António Botto, Edmundo Bettencourt e José Gomes Ferreira.

Teria sido uma boa surpresa se se tivessem lembrado do presencista António de Sousa, cronicamente esquecido. Almada e Irene Lisboa deviam ter tido mais espaço e a selecção de Sá-Carneiro é curta e descarta poemas como "Álcool", "Sete Canções de Declínio" ou "O Lord".

Da primeira década do século XX, foram escolhidos dez poetas: Régio, Nemésio (escolha vasta, mas demasiado centrada no livro "Limite de Idade"), Tomás de Figueiredo (melhor ficcionista do que poeta), Pedro Homem de Mello, Armindo Rodrigues, Alberto de Serpa, António Gedeão, com a inevitável "Pedra Filosofal" (que nem cantada se atura), Carlos Queirós, Miguel Torga e Adolfo Casais Monteiro. Não teria sido escandaloso acrescentar Francisco Bugalho ou António Pedro.

Poemas retalhados

Os anos 10 são férteis em neo-realistas, que talvez seja realmente tempo de ir reler (mas sem demasiadas expectativas), como Políbio Gomes dos Santos, Manuel da Fonseca, Luís Veiga Leitão, Joaquim Namorado, Mário Dionísio, João José Cochofel e Fernando Namora. É também a década em que nasceram o dispensável Tomaz Kim, Ruy Cinatti (a escolha é escassa e ignora os livros póstumos, que têm coisas admiráveis), Jorge de Sena, a muito datada Natércia Freire e Sophia de Mello Breyner Andresen, cuja selecção inclui apenas um exemplo, e irrelevante, de um livro, "Ilhas" (1989), que contém alguns dos melhores poemas da autora.

Os anos 20 abrem com Raul de Carvalho, Egito Gonçalves e Artur do Cruzeiro Seixas, cuja poesia é a confirmação de que o surrealismo, quando não é bom, é uma chatice pegada. Já a escolha de Carlos de Oliveira é um caso exemplar de indevida utilização de excertos. Em vez de respigarem fragmentos de poemas tão obviamente indivisíveis como "Descrição da Guerra em Guernica" ou "Salto em Altura", entre muitos outros textos aqui retalhados, os organizadores teriam feito melhor em escolher menos poemas e dá-los na íntegra.

Seguem-se Reinaldo Ferreira, o negligenciável Vasco Miranda (Pedro da Silveira, nascido no mesmo ano de 1922, é bastante melhor), Salette Tavares, Natália Correia (merecia mais do que dois poemas), Eugénio de Andrade, com uma escolha que associa o melhor do autor aos raros poemas francamente medíocres que escreveu (como esse que se inicia com o verso "Já gastámos as palavras pela rua, meu amor"), Mário Cesariny (selecção competente, mas escassa), António Manuel Couto Viana, Sebastião da Gama, Alexandre O'Neill, António Ramos Rosa (escolha um tanto preguiçosa), o irritante Daniel Filipe, de quem se dá na íntegra "A Invenção do Amor", um dos poemas mais "kitsch" de toda a lírica portuguesa, António Reis, Glória de Sant'Anna (menos relevante do que o lóbi africanista nos quer fazer crer), Vítor Matos e Sá (o livro póstumo "Companhia Violenta" tem poemas bastante melhores do que os dois aqui transcritos), Fernando de Lemos, David Mourão-Ferreira, António Maria Lisboa, Carlos Eurico da Costa, Alberto de Lacerda, Fernando Guimarães, João Rui de Sousa, Ana Hatherly e Fernando Echevarría.

Um final desconcertante

 Albano Martins, tradutor competente e um poeta bastante assim-assim, abre os anos 30. Segue-se Eduarda Chiote, com 14 poemas, mais do que os concedidos, por junto, a António Maria Lisboa, António José Forte, Armando  Silva Carvalho, Fátima Maldonado e Manuel Gusmão. Sem nenhuma animosidade em relação à poesia de Chiote - o seu livro "Branca Morte" (1994) é até bastante interessante -, são coisas destas que tornam um pouco difícil levar a sério esta antologia (ou a sua parte final), por muito trabalho que tenha dado a fazer e por muitos excelentes poemas que inclua.

Herberto Helder, em contrapartida, apesar das suas 28 páginas (Ruy Belo tem 39), não está muito bem representado, António José Forte foi reduzido a dois poemas, e seguem-se Rui Knopfli, E. M. de Melo e Castro, José Bento, Ruy Belo, António Osório (outra escolha pouco feliz, e que eleva a títulos de livros os nomes de ciclos de poemas dos volumes "A Ignorância da Morte" e "o Lugar do Amor"), Pedro Tamen, Manuel Alegre, José Carlos Ary dos Santos, Fernando Assis Pacheco (outra grande aposta de Reis-Sá e Lage, e esta é de saudar), Alberto Pimenta, Diogo Alcoforado, Luís Amorim de Sousa, Maria Teresa Horta, Fiama Hasse Pais Brandão, Armando Silva Carvalho, Casimiro de Brito e Luiza Neto Jorge, cuja importância os organizadores souberam reconhecer, a ponto de quase a terem colocado, em número de páginas, ao nível da incontornável Chiote. Num rol destes, não se vê grandes motivos para as ausências de Ernesto Sampaio, M. S. Lourenço ou António Barahona.

Nos anos 40 aparecem também autores francamente dispensáveis, como, por exemplo, José Manuel Mendes. De Joaquim Manuel Magalhães e João Miguel Fernandes Jorge dão-se apenas os títulos dos poemas escolhidos, uma vez que, tal como Jorge Gomes Miranda, recusaram integrar a antologia. E, como já se disse, são aviados com um só poema Manuel Gusmão - até se aceita que os seus dois primeiros livros não justificassem a meteórica consagração de que foi alvo, mas mereceu-a, "a posteriori", com o notável "Teatros do Tempo" (2001) e os títulos que se lhe seguiram - e Fátima Maldonado, autora de um dos melhores livros de estreia da poesia portuguesa contemporânea: "Cidades Indefesas" (1980).

Entre os nascidos nos anos 50, poetas como Fernando Guerreiro, Carlos Poças Falcão, Gil de Carvalho ou Luís Miguel Nava convivem com autores bastante menos relevantes, mas seria um pouco ocioso (leia-se: não há espaço) estar a contestar presenças e a propor alternativas. Refira-se só que Jorge Sousa Braga, a quem muito se deve como tradutor, e com cuja poesia se pode facilmente simpatizar, surge com 28 poemas, mais ou menos o dobro dos que Reis-Sá e Lage conseguiram desencantar na obra de Herberto Helder.

1 comentário:

  1. Experienciarmos o amor puro é indubitavelmente:

    Sairmos da dor por sentirmos amor e quando saímos do amor sentirmos dor. Quem já o experienciou:

    Jamais permitirá que a essência do seu ser termine num qualquer deserto vazio e por ser efetivamente assim:

    O aspirar por um novo amor assim, guarda em nós a possibilidade da construção de um novo viçoso jardim!

    O toque do amor puro é o que desde sempre todos os outros suplantou!

    Comentário inspirado no poeta/escritor/filósofo sito no seguinte website:

    www.miltoncoelho.weebly.com

    Para si (senhora poetisa Camila Carreira); para os seus leitores + para as suas leitoras:

    Bem haja/hajam!

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