Análise do Poema de Fernando Pessoa, Presságio

Poema "Presságio"

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...

Momentos de cultura e curiosidades poéticas...

Sobre o poema "Pressagio" de Fernando Pessoa


Datado de 24 de abril de 1928, o poema "Presságio", popularizado como "O amor, quando se revela", é uma composição de Fernando Pessoa. Escrito na fase final da vida do autor, é assinado com o seu nome (ortônimo), ilustrando várias caraterísticas da sua lírica.
Embora trate um tema tão universal como o amor, Pessoa não faz o elogio do sentimento, algo muito comum na poesia. Pelo contrário, é um desabafo do sujeito lírico acerca da sua dificuldade em estabelecer relações amorosas.

Significado do poema

Falando de amor, Pessoa exprime pessimismo e falta de coragem para enfrentar a vida, dois traços bastante habituais na poesia que assinou com seu verdadeiro nome (Pessoa ortônimo). Apesar de sentir desejos e paixões, como todo mundo, assume a sua incapacidade de ação face a eles. Embora quase todas as rimas estejam em verbos (que implicam ações), o sujeito apenas assiste a tudo, imóvel.

Aquilo que deveria ser fonte de felicidade e prazer transforma-se, invariavelmente, em dor. Ao longo de todo o poema,  transparece a sua atitude derrotista face ao amor, desacreditando a forma como os outros o encaram. Esta análise e intelectualização das emoções, quase até esvaziá-las de sentido, é outra característica da sua obra poética.

Para este sujeito, o sentimento só é verdadeiro quando não passa de um "presságio", existindo no seu interior, sem nenhum tipo de consumação ou reciprocidade, sem sequer a revelação da sua existência. O medo do sofrimento traduz em mais sofrimento,  já que ele não consegue avançar, correr atrás da própria felicidade.
Por tudo isto, como um sonho que é destruído no momento em que se materializa, a paixão correspondida parece uma utopia que nunca poderá alcançar.  No fundo, e acima de tudo, o poema é a confissão de um homem triste e derrotado que, não sabendo relacionar-se com as outras pessoas, acredita estar destinado a uma solidão irremediável.

Fernando Pessoa: poeta de muitos nomes

Fernando António Nogueira Pessoa (13 de junho de 1888 — 30 de novembro de 1935), considerado o maior nome da literatura portuguesa, escreveu poesia, prosa, teatro e ensaios críticos e filosóficos. Foi também tradutor, astrólogo, empresário e publicitário, entre outras coisas.

Aquilo em que mais se destacou foi o trabalho literário, nomeadamente o poético, que assinava com vários nomes diferentes. Não se tratavam de pseudônimos mas de heterônimos, ou seja, entidades individuais que possuíam seus próprios gostos, estilos, influências, valores e crenças.

Criando e incorporando tantas personalidades, assinava também poemas com seu nome próprio, onde expunha frequentemente sua fragilidade e relação conturbada com os outros. Numa leitura mais biografista, sabemos que Pessoa mantinha um namoro intermitente com Ofélia Queirós, com quem se encontrava e, sobretudo, correspondia por cartas.

Em 1928, quando escreveu "Presságio", a relação estava terminada. Este dado pode contribuir para compreendermos melhor toda a desilusão contida no poema. Embora tenha reatado no ano seguinte, a relação não avançou. Ofélia e Pessoa nunca casaram e poeta permaneceu dividido entre a solidão existencial e o trabalho compulsivo da escrita.

2 comentários:

  1. O pavor da rejeição foi/é/será para a mente e/ou para o coração e/ou para a alma uma temporal/espacial maldição que rapidamente se transforma em correntes pesadas e enferrujadas sitas numa qualquer prisão; mas: o alcance do amor pessoal e/ou do amor familiar e/ou do amor social foi/é/será para a mente e/ou para o coração e/ou para a alma presságio de sempiterna bênção = libertação!

    Que entre os povos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa haja a visão de partilharem as palavras de pessoas como você (humana de dentro para fora) entre eles.

    Comentário inspirado no autor (que igualmente divulga o seu ativismo humanista no seu website) das seguintes frases:

    "Pátria Lusitana: eterna soberana"; "For knowledge leverage, try Portuguese Language"; "Raciocina com paixão, discernindo com asserção"; "Aprende a partilhar, words and knowledge" e "Colore o cérebro com a Língua Portuguesa".

    Conselho: continue a "partilhar, palavras e conhecimento/aprendizagem/sabedoria"...

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  2. Essa interpretação é mais do intérprete do que de Pessoa

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