Poema: Reviver o passado, sem presente. (Análise do poema Futuro de José Saramago)

A vida escreve-se no presente
Mas toda me versa do passado
Vertida em memórias pujantes e estridentes
Derramadas impiedosas na alma
Persistem e assombram como fantasma
Nítidas e pesadas, vincadas
Ofuscam o presente como a tarde que vem e o dia apaga
Fria de luz fumacenta e vagarosa
esforço de sombras a arrastar
Horas sem fim, o passado sempre a chegar
O instante é abalroado
Condenado a nunca singrar
Extinguem-se sorrisos neste Novembro cinza e maduro
Porque o Outubro inevitável
- foi irremediável e duro -
Imutável e tão escuro
Janela que não abre nem dá sóis
E por mais que supere todas as alvoradas –
Não alcanço luz
Agrilhoada no peso cego das memórias
Vício que não me liberta do rigor,
Olhos presos lá atrás na dor
Fogueira viva onde regresso
a queimar quimeras como pétalas secas
Sou em mim meu único exílio
Em que o tempo se escreve depois
Vou por aí que nem sombras
A somar êxtases na orla das palavras que redijo vã


Camila Carreira