Poema: Sopro de vida

camila carreira, poemas de amor rosas e cinzas, poetisa portuguesa

Frases de dor e sonhos


Em masmorra erma aprisionada
Solto o sonho em mansão vazia
Fito a vida vã que não vale nada
É mero sopro... quimera doentia

É conjuntura de efémero tormento
Pertinaz ida, dor áspera consentida
Um rasto apagado sem rendimento
Jornada forçada sem porta de saída

O tempo que passa trespassa vidas
E nada derrete este gelo sepulcral
Que apossado d´almas já vencidas
Paralisa-as cativas até ao juízo final

***CAMILA CARREIRA***

Momentos de cultura e curiosidades poéticas... 


Fernando Pessoa
Para Orpheu - Sentir é criar.

Para Orpheu
Sentir é criar.
Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o Universo não tem ideias.

— Mas o que é sentir?
Ter opiniões é não sentir.
Todas as nossas opiniões são dos outros.
Pensar é querer transmitir aos outros aquilo que se julga que se sente.
Só o que se pensa é que se pode comunicar aos outros. O que se sente não se pode comunicar. Só se pode comunicar o valor do que se sente. Só se pode fazer sentir o que se sente. Não que o leitor sinta a pena comum [?]. Basta que sinta da mesma maneira.
O sentimento abre as portas da prisão com que o pensamento fecha a alma.

A lucidez só deve chegar ao limiar da alma. Nas próprias antecâmaras do sentimento é proibido ser explícito.
Sentir é compreender. Pensar é errar. Compreender o que outra pessoa pensa é discordar dela. Compreender o que outra pessoa sente é ser ela. Ser outra pessoa é de uma grande utilidade metafísica. Deus é toda a gente.
Ver, ouvir, cheirar, gostar, palpar — são os únicos mandamentos da lei de Deus. Os sentidos são divinos porque são a nossa relação com o Universo, e a nossa relação com o Universo Deus.
[.. .]

Agir é descrer. Pensar é errar. Só sentir é crença e verdade. Nada existe fora das nossas sensações. Por isso agir é trair o nosso pensamento.
[...]

Não há critério da verdade senão não concordar consigo próprio. O universo não concorda consigo próprio, porque passa. A vida não concorda consigo própria, porque morre. O paradoxo é a fórmula típica da Natureza. Por isso toda a verdade tem uma forma [?] paradoxal.
[...] Afirmar é enganar-se na porta.

Pensar é limitar. Raciocinar é excluir. Há muito que é bom pensar, porque há muito que é bom limitar e excluir.
[...]

Substitui-te sempre a ti próprio. Tu não és bastante para ti. Sê sempre imprevenido [?] por ti próprio. Acontece-te perante ti próprio. Que as tuas sensações sejam meros acasos, aventuras que te acontecem. Deves ser um universo sem leis para poderes ser superior.
camila carreira, poemas de amor rosas e cinzas, poetisa portuguesaSão estes os princípios essenciais do sensacionismo. [ . . . ]

Faz de tua alma uma metafísica, uma ética e uma estética. Substitui-te a Deus indecorosamente. É a única atitude realmente religiosa. (Deus está em toda a parte excepto em si próprio).
Faz do teu ser uma religião ateísta; das tuas sensações um rito e um culto. [...]
1916?
Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1966.  - 216.   
           

Este poema reflete um estado de espírito de desesperança e desassossego, porque afinal viver e sentir a vida, sem grilhões, dando asas às emoções, é alternar entre estados de espírito.

camila carreira, poemas de amor rosas e cinzas, poetisa portuguesaFelicidade e sofrimento. E na poesia podemos vivenciar e expressar, esses estados de espírito que nos assolam e invadem sem que alguém os convide. Que entram e saem sem avisar. Nós somos meros casulos onde esses sentimentos se aninham em inesperadas crisálidas se transformam depois, dando origem ora a lindas mariposas mas também a outros seres menos graciosos.
Viver é ganhar e ficar com medo de perder. É perder e mesmo assim sentir-se apaticamente tranquilo por saber que não há mais nada a perder.
Uma espécie de rendição à avassaladora realidade que nos abalroa. Nos tempos que correm com a sobrevalorização da literatura de auto-ajuda e a psicologia positiva, em que se acredita que o pensamento positivo resolve tudo e temos que agradecer, todos os dias, o facto de simplesmente estarmos vivos, é complexo admitir para si mesmo e também para os outros que a vida é dura.

Freud explica o quão utópica é a felicidade


poesia negra, camila carreira, poetisa, frases de sofrimento"O desassossego na civilização" foi escrito em 1930 por Sigmund Freud, partindo do pressuposto que o indivíduo é um ser infeliz, e que esse mesmo indivíduo viverá sempre numa infelicidade permanente. Freud especula que mesmo com o advento da ciência, religião e arte como artifício de sublimação do sofrimento, o homem não obteve o contentamento da felicidade. A nomenclatura felicidade pode ser analisada a partir da ideia moderna existente nela, sabemos que todo ser humano tem um ideal de felicidade, e que o homem se posiciona diante da busca por esse ideal. A felicidade é um conceito conhecido pelo senso comum, porém, analisando de maneira análoga, é um objeto muito mais complexo e - pelo viés de Freud - utópico.

Freud se encarregou exaustivamente em analisar o tema, ele afirma que existem impulsos que levam o homem a buscar a felicidade, procurando constantemente sensações de prazer e, em contrapartida, evitando o desprazer. Exemplo moderno dessa necessidade de afastamento do desprazer é o intuito com que muitos vão em busca de análise, psicanalistas são procurados com a finalidade de aliviar dores, na expectativa de uma felicidade imediata e plena.

Freud diz que o ser humano vive em uma reta constante e infinita de busca pelo prazer, mas essa satisfação é impossível de ser realizada, gerando a partir disso uma série de descontentamentos. Usando como base as análises de Freud, podemos entender que existem dois tipos de busca pela felicidade: A ausência da dor e o sentimento de prazer propriamente dito. Freud enfatiza a felicidade momentânea, discorrendo sobre ela como se fosse o mais próximo da felicidade que podemos chegar, nas palavras de Freud: "O que se chama felicidade no sentido mais estrito resulta da satisfação bastante súbita de necessidades fortemente postas em êxtase e, por sua natureza, é possível somente como um fenômeno episódico".

Freud também aponta os limites da cultura que estamos inseridos como sendo fortes geradores de infelicidade, ao passo que a exigência imposta pela civilização torna a meta pela felicidade algo impossível. A cultura exige do homem sacrifícios, causando assim o supracitado mal estar. Para manutenção da sociedade, nos é exigido acatar ordens e leis, a busca pelo gozo do prazer e o individualismo são colocados em segundo plano, nas palavras de Freud: "A liberdade individual não é um patrimônio da cultura".

Na concepção freudiana, existe uma forte abdicação da vontade do homem, para viver de acordo com as normas e preceitos da sociedade, abrindo mão das suas pulsões de prazer. Freud diz que "O homem da cultura trocou uma parte de felicidade por uma parte de segurança", ele se refere a repressão social frente a agressividade e sexualidade natural de todo ser humano, tornando, desta forma, o homem infeliz. "Posto que a cultura imponha tantos sacrifícios não somente à sexualidade, mas também à inclinação agressiva do ser humano, compreendemos melhor que os homens dificilmente se sintam felizes dentro dela".

Podemos entender, analisando de maneira simplória os recortes freudianos, além dos nossos limites psíquicos que transformam a felicidade em uma meta impossível, existem os limites inibidores oriundos da cultura. A civilização exige do homem limpeza, ordem e beleza, o mal estar na civilização é uma condição inerente ao homem moderno. A ansiedade e a exigência de se adaptar aos valores sociais, cria o ser humano como um verdadeiro produtor de mal estar. Em linhas gerais, podemos resumidamente dizer que Freud destaca a cultura como limitadora da própria felicidade, proporcionando o principal sentimento de desprazer que habita no ser humano.

2 comentários:

  1. A vida para alguns de nós -[seres humanos]- tem -[sem dúvida]- sido dura (em termos físicos + em termos psíquicos); mas: o sonhar com uma vida mais mole e soltar esse mesmo sonho na tal mansão vazia poderá ser a tal “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura” (conhecedor/assertivo/sábio ditado português).

    O experienciar da felicidade é como a luz que trespassa as trevas; logo: será sempre maior que o experienciar da infelicidade que a nós quer retirar o gosto de viver.

    Devemos guardar em nós, pelo menos, uma gota de felicidade já experienciada = mãos internas que a nós poderão ciclicamente levantar das quotidianas amarguras. Isso/isto não é pensamento positivo e/ou escrita de autoajuda e sim sopro de vida autónomo, que, de forma natural, revela ao mundo exterior que a sensatez foi/é/será a arma ideal para derrotar consecutivamente a oferecida exterior escassez.

    Há muitas razões que levam os homens e que levam as mulheres a abdicarem do sonho de serem felizes interiormente e há que respeitar as suas decisões; mas: que nenhuma dessas decisões seja tomada por causa de outrem; pois, mesmo que sejamos ferozmente abraçados pelos braços solidão diária, podemos, se quisermos, experimentar a felicidade de múltiplas outras formas. O que importa é pensarmos/sentirmos/aspirarmos mui para além do vazio que aprisiona o nosso sopro da vida.

    A nossa vontade de viver jamais deverá deixar de ser atrevida!

    Comentário inspirado no poeta/escritor/filósofo sito no seguinte website:

    www.miltoncoelho.weebly.com

    Para si (senhora poetisa Camila Carreira); para os seus leitores + para as suas leitoras:

    Bem haja/hajam!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sábio quem tal narrativa escreve, grata por partilhar

      Eliminar