Impiedosamente meus tesouros quebrados
Tenras vidas desfeitas em mil pedaços
Por um louco sem empatia e sem laços
Cada estilhaço dum filho meu atinge-me
Em golpe fundo e afiado que me lacera
Cada laceração é uma ferida viva,
Aberta sangra e que nunca sara
Memórias severas sequestram-me
E choro em olhar baço e embargado
Meus filhos… tesouros por mim zelados
Que deploro agora partidos desfigurados
Estes já não são os filhos por mim criados
São vítimas da dor… traídos enganados
São outros, sim, mas também amados
Dei a vida para os manter resguardados
Mas a devastação foi maior que toda eu
Lágrimas deambulam nos meus olhos turvados
Revoltados impotentes irados
Tento em vão, recuperar os pedaços
Dos meus tesouros perfeitos
Que tanto sacrifiquei para ninguém quebrar
Olho triste… Desenganada… rendida caio prostrada
Tanto amor e dedicação, ali espalhados no chão…
E o responsável ri e foge sem comiseração
Ser mãe, abre brechas nas forças, na alma e no coração,
Que jamais podemos fechar,
E cada dor que vem, entra sem perguntar.
E fica para sempre sem atenuar
O amor de mãe expõe-nos.
Ser mãe é assim, amar sem nunca ter fim.
Ser frágil pelos filhos mesmo que forte por mim
**** Camila Carreira ***
Momentos de cultura e curiosidades poéticas...
Fernando Pessoa
O MENINO DA SUA MÃE
O MENINO DA SUA MÃE
No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado
— Duas, de lado a lado —,
Jaz morto, e arrefece.
Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.
Tão jovem! que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino da sua mãe».
Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lha a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.
De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço... Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.
Lá longe, em casa, há a prece:
«Que volte cedo, e bem!»
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.
s. d.Poesias. Fernando Pessoa. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995). - 217.
1ª publ. in Contemporânea , 3ª série, nº 1. Lisboa: 1926.
(Mãe é ser frágil, não ter o super poder de proteger os filhos de quem lhes faz mal. Mais doloroso quando a fonte do mal vem de quem, por natureza tem o dever e prometeu protegê-los acima de qualquer coisa.
A fragilidade da condição de ser mãe impede-nos de fugir. Impede-nos de lutar, debilita-nos. Impede-nos de negociar. Ficamos vulneráveis.
É impossível escapar ao perpétuo veredicto da dor de se ser mãe.
E por muito que tentemos fugir ou alhear-nos, a dor dói sempre como se estivesse a viver dentro de nós. E quem nos quiser submeter, coagir, destruir sabe por onde nos pode vergar e como negociar, subjugar.
A fragilidade da condição de ser mãe impede-nos de fugir. Impede-nos de lutar, debilita-nos. Impede-nos de negociar. Ficamos vulneráveis.
É impossível escapar ao perpétuo veredicto da dor de se ser mãe.
E por muito que tentemos fugir ou alhear-nos, a dor dói sempre como se estivesse a viver dentro de nós. E quem nos quiser submeter, coagir, destruir sabe por onde nos pode vergar e como negociar, subjugar.
Heróis são também os filhos que emergem e sobrevivem a ataques cobardes, abandonos e traições, porque esses ataques vêm sempre das pessoas que se amam, contra as quais nunca se ergueram defesas, nem muros. Pelo contrário, são pessoas às quais abrimos as portas, o coração e criamos pontes.
Ataques desses, são os mais devastadores, e inesperados... cobardia pura.)
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