Poema alerta da desumanidade

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PSEUDO HUMANOS 

Que fizeste tu, humano, ao teu mundo?
Que fizeste tu, humano, à humanidade?
Do mundo fizeste teu aterro imundo
E nele semeaste tua desumanidade

Que fizeste tu humano à alegria de viver?
Que fizeste tu humano à tua sanidade?
Fizeste do gozo de viver o triste sofrer
E alhearam-te da dor sedando a realidade

Que fizeram os homens ao amor?
Que fizeste tu, humano à lealdade?
Fizeram do amor o cadafalso da dor
E executam ali, os que amam de verdade

Que fizeram os homens à paz na terra?
Que fizeram os homens à liberdade?
Criaram o dinheiro e nasceu guerra
E ei-los vassalos da fome e precariedade

Que fizeram os homens aos outros seres?
Que fizeram os homens à mãe natureza?
Sujeitaram ambos aos seus vícios e prazeres
E agora comem e bebem o lixo da impureza

Que fizeram os homens às jovens gerações?
Que fizeram os homens ao futuro da humanidade?
Corromperam as crianças com virtuais relações
Condenaram o mundo à ignorância e mediocridade

*** Camila Carreira *** 


Momentos de cultura.... 



Álvaro de Campos
E eu que estou bêbado de toda a injustiça do mundo...



E eu que estou bêbado de toda a injustiça do mundo...
— O dilúvio de Deus e o bebé loirinho boiando morto à tona de água,
Eu, em cujo coração a angústia dos outros é raiva,
E a vasta humilhação de existir um amor taciturno —
Eu, o lírico que faz frases porque não pode fazer sorte,
Eu, o fantasma do meu desejo redentor, névoa fria —
Eu não sei se devo fazer poemas, escrever palavras, porque a alma —
A alma inúmera dos outros sofre sempre fora de mim.
Meus versos são a minha impotência.
O que não consigo, escrevo-o;
E os ritmos diversos que faço aliviam a minha cobardia.
A costureira estúpida violada por sedução,
O marçano rato preso sempre pelo rabo,
O comerciante próspero escravo da sua prosperidade
— Não distingo, não louvo, não (...) —
São todos bichos humanos, estupidamente sofrentes.
Ao sentir isto tudo, ao pensar isto tudo, ao raivar isto tudo,
Quebro o meu coração fatidicamente como um espelho,
E toda a injustiça do mundo é um mundo dentro de mim.
Meu coração esquife, meu coração (...), meu coração cadafalso —
Todos os crimes se deram e se pagaram dentro de mim.
Lacrimejância inútil, pieguice humana dos nervos,
Bebedeira da servilidade altruísta,
Voz com papelotes chorando no deserto de um quarto andar esquerdo...
s.d. Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.  - 110.

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