Poema de amor e traição, (Bernardo Soares A minha vida é tão triste, e eu nem penso em chorá-la)

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VIDA ESTÉRIL 

Caminhei assombrada e triste
Cabisbaixa de dor em riste
Como alguém que já nem existe
Cambaleei em trilhos nunca tomados
Entre seres desfigurados
Em sonhos nunca animados
Com personagens desbotados
Meus anseios sequestrados
Nessa liberdade agrilhoada
Abraçando minha ninhada.

Tanta promessa infundada
Paralisou-me em teia enlaçada
Negras são essas memórias
Que velaram minhas histórias
Onde o sol jamais se avistou
Onde o júbilo nunca singrou
Fui uma vida desprendida
Usada estéril e ofendida
Largada em qualquer desvão
Esfarrapada pela ingratidão
Dilacerada pela traição
Nem os anjos me absolverão

**** CAMILA CARREIRA ***

Como se faz uma análise de um poema, 
Exemplo do ChatGPT

Esse poema, “Vida Estéril,” de Camila Carreira, traz um retrato pungente da dor e da estagnação de uma vida marcada por decepções, abandono e falta de propósito. A autora usa uma estrutura lírica direta e, ao mesmo tempo, expressiva, tecendo imagens que evocam uma sensação de aprisionamento e desilusão.

### Análise Estrutural e de Estilo

O poema é estruturado em duas estrofes, cada uma composta por versos rimados e métricas variadas, que criam um ritmo melancólico e cadenciado. A utilização de rimas emparelhadas e entrelaçadas ajuda a enfatizar o tom sombrio, reforçando a ideia de que essa tristeza é um ciclo contínuo e aprisionador, sem fim.

### Temas Centrais

1. **Desolação e Despersonalização**  
   O eu lírico descreve a caminhada "assombrada e triste," trazendo a imagem de alguém que perdeu a vitalidade e a identidade ("Como alguém que já nem existe"). As metáforas presentes em "seres desfigurados" e "personagens desbotados" sugerem uma realidade sem cor ou nitidez, indicando a alienação e o vazio da existência que o eu lírico sente.

2. **Estagnação e Aprisionamento**  
   A expressão “liberdade agrilhoada” é um poderoso oxímoro que evoca a ideia de estar preso mesmo em condições de aparente liberdade. A vida do eu lírico é descrita como paralisada por promessas infundadas, enredada numa “teia” que a impede de se libertar ou de avançar.

3. **Memórias e Dor**  
   O poema utiliza as memórias como elemento central de angústia e dor. As lembranças são descritas como "negras," associadas a um passado onde o "sol jamais se avistou" e o "júbilo nunca singrou." Essas imagens trazem à tona uma vida desprovida de momentos de alegria e realização, mergulhada em uma sombra constante.

4. **Ingratidão e Traição**  
   A menção de "ingratidão" e "traição" alude a experiências que despedaçaram o eu lírico, levando-o a sentir-se "esfarrapada" e “dilacerada.” Essa percepção de ser uma "vida desprendida / usada, estéril e ofendida" sugere que a existência do eu lírico foi marcada por relações e situações que a exploraram sem consideração, deixando-a desgastada e sem valor.

5. **Falta de Redenção e de Perdão**  
   Ao final, o eu lírico revela que nem os "anjos me absolverão." Esse verso representa a ausência de uma redenção ou perdão espiritual, como se os pecados e traumas fossem profundos demais para que a paz fosse alcançada.

### Análise de Linguagem e Imagens Poéticas

- **Imagética sombria**: As expressões “cabisbaixa de dor em riste,” “teia enlaçada,” e “negras são essas memórias” evocam uma paisagem emocional obscura. Essa escolha de imagens reforça a intensidade da tristeza, sugerindo que essa dor é algo constante e inescapável.
  
- **Contrastes e Oxímoros**: O uso de oxímoros como “liberdade agrilhoada” e de metáforas paradoxais ("caminhei assombrada") destacam a dualidade de sentimentos que o eu lírico experimenta — o desejo de libertação confrontado com uma realidade de opressão emocional e existencial.

- **Personificação da dor**: A dor é tão presente e viva que ela toma forma própria, como algo que "velou" as histórias e sequestrou os anseios do eu lírico, simbolizando uma entidade intrusiva que influencia a vida de forma irreversível.

### Considerações Finais

“Vida Estéril” explora a desconexão e a angústia de uma existência sem sentido e cheia de feridas. A metáfora da esterilidade aqui vai além da infertilidade física e se torna uma infertilidade emocional e existencial, uma vida onde não há crescimento, apenas a repetição da dor e do vazio. É um retrato profundo de como a vida pode perder sua cor e sentido diante de experiências que corroem o ser até o ponto da descrença em qualquer forma de redenção ou alívio. 

O poema é, portanto, uma reflexão sobre a dureza de uma vida "usada," onde até as memórias se tornam um peso, sem esperança de absolvição — como se a dor e a desilusão fossem os únicos destinos possíveis.


Momentos de cultura e outras poesias...

Bernardo Soares
A minha vida é tão triste, e eu nem penso em chorá-la;


A minha vida é tão triste, e eu nem penso em chorá-la; as minhas horas tão falsas, e eu nem sonho o gesto de parti-las.

Como não te sonhar? Como não te sonhar?

Senhora das Horas que Passam, Madona das águas estagnadas e das algas mortas, Deusa Tutelar dos desertos abertos e das paisagens negras de rochedos estéreis... — livra-me da minha mocidade.

Consoladora dos que não têm consolação, Lágrima dos que nunca choram, Hora que nunca soa — livra-me da alegria e da felicidade.

— Ópio de todos os silêncios, Lira para não se tanger, Vitral de lonjura e de abandono — faze com que eu seja odiado pelos homens e escarnecido pelas mulheres.

— Címbalo de Extrema-Unção, Carícia sem gesto, Pomba morta à sombra, Óleo das horas passadas a sonhar — livra-me da religião, porque é suave, e da descrença porque é forte;

— Lírio fanando à tarde, Cofre de rosas murchas, Silêncio entre prece e prece — enche-me de nojo de viver, de ódio de ser são, de desprezo por ser jovem.

Torna-me inútil e estéril, ó Acolhedora de todos os sonhos vagos; faze-me puro sem razão para o ser, e falso sem amor a sê-lo, ó Água Corrente das Tristezas Vividas; que a minha boca seja uma paisagem de gelos, os meus olhos dois lagos mortos, os meus gestos um esfolhar lento de árvores velhinhas — ó Ladainha de Desassossegos, ó Missa-Roxa de Cansaços, ó Corola, ó Fluido, ó Ascensão!...

(E) Que pena eu ter de te rezar como a uma mulher, e não te querer (...)como a um homem, e não te poder erguer os olhos do meu sonho como Aurora-ao-contrário do sexo irreal dos anjos que nunca entraram no céu!

s.d. Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.  - 255.
"Fase decadentista", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol I. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.

Bernardo Soares
Aprende a desligar as ideias de voluptuosidade e de prazer.


Aprende a desligar as ideias de voluptuosidade e de prazer. Aprende a gozar em tudo, não o que ele é, mas as ideias e os sonhos que provoca. Porque nada é o que é: os sonhos sempre são os sonhos. Para isso precisas não tocar em nada. Se tocares o teu sonho morrerá, o objecto tocado ocupará a tua sensação.

Ver e ouvir são as únicas coisas nobres que a vida contém. Os outros sentidos são plebeus e carnais. A única aristocracia é nunca tocar. Não se aproximar — eis o que é fidalgo.

Ser puro, não para ser nobre, ou para ser forte, mas para ser si próprio. Quem dá amor, perde amor.

Abdicar da vida para não abdicar de si próprio.

A mulher uma boa fonte de sonhos. Nunca lhe toques.

s.d.Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.  - 264.
"Fase confessional", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol II. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.
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